Detetives do tártaro: o que ele pode revelar sobre os primeiros humanos?

O tártaro é uma rica fonte de informações ‘secretas’ sobre nossa dieta. Cientistas descobriram o que nossos antepassados da Idade da Pedra comiam analisando o tártaro de seus dentes!
Quando vamos ao dentista, geralmente ouvimos a recomendação de escovar bem os dentes para evitar a formação de tártaro. Esse tipo endurecido de placa bacteriana, como explicamos aqui no Blog do Dr. Felix no texto “O que é e como tratar o Tártaro Dental?”, é ruim para nossos dentes e pode causar uma série de doenças bucais.
Encontrar tártaro, porém, não é uma má notícia para todo mundo. Você sabia que arqueólogos, quando encontram tártaro nos dentes de esqueletos, vibram de alegria? Isso porque, a partir do tártaro, eles podem descobrir informações valiosas sobre o estilo de vida de pessoas que viveram milhares de anos atrás.
Esse foi o caso de pesquisadores da Universidade de Tel Aviv, em Israel. Ao analisar o tártaro presente em esqueletos humanos de mais de 400 mil anos de idade, achados na caverna de Qesem, no mesmo país, eles descobriram não apenas que aquelas pessoas se alimentavam essencialmente de derivados de vegetais, mas também que utilizavam fogo quase diariamente.
Ai de nós que achávamos muito moderno nosso fogão cooktop…

Dentes humanos encontrados na caverna de Qesem, em Israel. (Foto: Prof. Israel Hershkovitz, Tel Aviv University)
DENTES REVELAM INDÍCIOS DE CHURRASQUINHO DAS CAVERNAS
Os cientistas encontraram traços de carvão no tártaro desses dentes super antigos. Isso provavelmente foi o resultado da inalação de fumaça de fogueiras feitas dentro da caverna para cozinhar alimentos e para aquecimento. Esse tipo de poluição respiratória, ressaltam os autores da pesquisa, pode ter causado danos à saúde daqueles indivíduos.
“Essa é a primeira evidência de que os primeiros churrascos feitos “dentro de casa” podem ter tido consequências relacionadas à saúde”, conta o arqueólogo Ran Barkai, um dos envolvidos no estudo. “As pessoas que viveram na caverna de Qesem aproveitaram os benefícios do fogo – cozinhando suas carnes – mas eles também tiveram que achar uma maneira de controlar o fogo – de viver com ele”.
De acordo com os pesquisadores, o tártaro de dentes humanos dessa idade nunca havia sido estudado antes. Como a caverna permaneceu fechada por mais de 200 mil anos, tudo lá dentro, incluindo dentes e o tártaro presente neles, foi extremamente bem preservado.
“Esse é uma das mais antigas evidências de poluição causada por seres humanos no planeta, se não for a mais antiga”, diz Barkai.
O QUE COMIAM NOSSOS ANTEPASSADOS DAS CAVERNAS?
Foram encontrados no tártaro também vestígios de ácidos graxos essenciais (substâncias que compõe gordura), possivelmente proveniente de nozes ou sementes, e pequenas partículas de amido.
“Sabemos que os moradores dessa caverna comiam animais e os exploravam inteiramente”, afirma Barkai. “Sabemos também que eles os caçavam, assavam e usavam seus ossos como martelos. Agora temos evidências diretas de sua dieta baseada em vegetais, mas com a presença de carne e gordura”.
Em meio ao tártaro, os pesquisadores também observaram pequenas fibras de plantas, que eles suspeitam que foram usadas para limpar os dentes – já imaginou como era tirar aquele pedacinho chato de carne do meio do dente com esses palitinhos pré-históricos?
“Nossos achados são raros – não há nenhuma outra descoberta similar desse período. A descoberta do carvão e do amido nos dá uma ideia melhor de como essas pessoas viviam – e essa visão mais ampla veio diretamente de seus dentes”, conclui Barkai.
Eis aí pelo menos um ponto positivo do tártaro: permitir aos cientistas descobrir mais sobre a interessante vida dos primeiros humanos! Fora isso, não tem jeito: o melhor mesmo é eliminar o tártaro o quanto antes, e visitar regularmente seu dentista para garantir que ele jamais se forme em sua boca. Os arqueólogos do futuro talvez reclamem dessa dica, mas sua saúde certamente sairá fortalecida.
O TÁRTARO PROVA NOSSO HISTÓRICO DE BEBEDORES DE LEITE!
Pesquisas com tártaro presente nos dentes de esqueletos também forneceram a primeira evidência direta do consumo de leite de outras espécies de animais.
Um estudo liderado pela antropóloga Christina Warinner, da Universidade de Oklahoma, nos Estados Unidos, analisou o tártaro de dentes humanos da Idade do Bronze (que ocorreu há mais de 5 mil anos atrás). Os pesquisadores encontraram no tártaro uma das principais proteínas do leite de mamíferos, mas não de seres humanos, chamada de betalactoglobulina. No trabalho, eles identificaram que indivíduos daquela época já consumiam leite (ou produtos derivados do leite) de vaca, ovelha e cabra.